segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

A fera

Foto: Hélio Beltrânio

risque um fósforo nas suas virilhas
acenda o cigarro na minha boca
um homem deixou um choro de criança
recém-nascida
o mundo não se afogou no seu umbigo
eu enterrei o meu, mas narciso não morreu
meus pulsos dedilhados por teus dedos
poderíamos morrer de amor
mas é tão patético e frio
ninguém toca tão raso como você
não se proteja depois de cair
do décimo terceiro andar e o vigésimo homem
abriu as cortinas antes do dia abrir as pernas
e parir a noite na esquina da 25 de março
ninguém vê ninguém
perdi a conta de quantos orifícios tenho
no corpo vazios impreenchíveis
não mergulhe se quiseres voltar à superfície
eu não escrevo porque sei escrever
escrevo porque a morte me chama e agora
não posso dizer sim eu só posso olhá-la
contemplando o abismo irreparável no papel
as grades das linhas tentando prender
a fera machucada tentando se soltar
tentando se livrar e sem carne
para se alimentar pra não morrer de fome
come
sua própria carne na mesa sem facas
afiadas as palavras ditas por sua boca
mórbida
costuram suas feridas em cima
das minhas cicatrizes

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